terça-feira, 15 de julho de 2014

Regularização fundiária na região do Jari está próxima.

Um dos processos mais polêmicos de regularização fundiária no Pará e Amapá, na região do Projeto Jari, está perto de ser concluído. Depois de décadas de uma disputa pela posse da terra entre as comunidades centenárias da região e o grupo Jari Florestal, a questão está perto de ser resolvida com a união de forças do MPE/PA (Ministério Público do Estado), Governo Federal e Iterpa (Instituto de Terras do Pará), órgão responsável pela normalização dos territórios. O objetivo é acabar com os conflitos fundiários no Vale do Jari e dar a posse definitiva da mesma para beneficiar tanto as comunidades tradicionais quanto o Grupo Jari, que produz celulose na região e representa a principal fonte de emprego e renda na área. Um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) também deve ser assinado em breve para definir a regulamentação das áreas.
Pelo levantamento do MPE, pelo menos 10 mil pessoas de 153 comunidades estão envolvidas no processo de regularização fundiária na área de 91.600 quilômetros quadrados do projeto, o que corresponde a três estados do Alagoas. O impasse está no fato de que sem as devidas marcações legais da terra, nem as comunidades tradicionais da região e nem o Grupo Jari podem administrar suas áreas de forma legal.
O agricultor paraense Manoel Santos de Oliveira, 55 anos, representa quatro comunidades da área do município de Almeirim, no baixo amazonas, onde fica o projeto. Trabalhando há mais de 25 anos na terra, ele disse que os moradores da região querem deixar de ser posseiros para trabalhar legalmente na terra. 'Nós sobrevivemos daquilo ali, plantamos e colhemos em nossas hortas. Então, tudo que queremos é a posse da terra, de maneira correta, para tirarmos nosso sustento de lá. Queremos o que é de direito', explica o agricultor, ressaltando que mais de 200 famílias dessas quatro comunidades sobrevivem exclusivamente da agricultura na região. Manoel também destacou que a maioria das disputas violentas pela terra na região são causadas por pessoas de fora do Estado. 'Nós estamos aqui há anos, mas tem gente que veio até de fora do Pará e também quer uma parte da terra, aproveitando o processo que está sendo desenrolado. Eles que fazem a bagunça', conta.
A promotora de Justiça Agrária de Santarém, Ione Massae Nakamura, acompanha o processo de perto desde o ano passado. Em fevereiro deste ano ela esteve discutindo o caso na 605ª Reunião da Comissão Nacional de Combate à violência no Campo, em Belém, e também já explicou como está a regularização da área durante uma reunião da Comissão de Integração Nacional, Desenvolvimento Regional e da Amazônia, ocorrida no final de maio, em Brasília. Ao ORM News, Nakamura disse que há um entendimento sobre o impasse entre as comunidades e o Grupo Jari. 'Há consenso na necessidade de regularização das posses das áreas das comunidade, bem como informação e incentivo para regularização das atividades de subsistência e exploração dos recursos naturais na região pela empresa, sendo importante ressaltar que as áreas das comunidades devem ser as que possibilitem sua reprodução social e econômica, incluindo áreas tradicionais de pesca, extrativismo, caça, áreas para construção de escolas, barracão da comunidade, postos de saúde, etc.', explica.
A promotora também apontou algumas dificuldades na regularização fundiária no Vale do Jari. Entre elas está a organização das comunidades, que possuem problemas de deslocamento, de acesso à informação e de conhecimento de seus direitos. Para ela, apesar de o Grupo Jari ter interesses econômicos na região, ele percebeu que a regularização também é boa para empresa, que pode fazer mais parcerias com as comunidades.
Conflitos.
 A região do Projeto Jari é palco de conflitos fundiários há quase quatro décadas, desde que foi implantada a empresa no local, no ano de 1967. Foi nessa época que se acentuaram os conflitos fundiários e agrários que duram até hoje. Esses casos estão sendo investigados pelo MPE desde que foi instaurado na Promotoria de Justiça Agrária de Santarém, ano passado, procedimento extrajudicial para acompanhar os conflitos pelo modo de ocupação e posse da terra na região, que fica entre os Rios Paru, Jari e Amazonas, localizado no município de Almeirim. Segundo a promotora, com a instalação da empresa no local, muitas comunidades extrativistas e agricultores foram impedidos de entrar na área do projeto. Também há relatos de grupos e posseiros que promovem ações contra as comunidades tradicionais, dificultando o processo de entendimento. 'Ocorre que muitas comunidades vivem há gerações na região e sobrevivem do extrativismo da castanha do pará, do açaí, e de agricultura familiar, além da existência de contratos de fomentos de plantio de eucalipto incentivado pela empresa, e, portanto, são essas comunidades que possuem a posse efetiva da terra. Muitas comunidades já existiam antes do projeto econômico na região e outras se formaram a partir das empresas que se instalaram e trouxeram mão de obra de fora, especialmente, dos estados do nordeste e de outros municípios da região', observa ela.
Nakamura ressaltou ainda que há denúncias de que a empresa tem promovido desapropriações e expulsado agricultores de maneira ilegal. 'Até o momento, não houve morte pela posse dessas terras, porém, há relatos de ameaças de seguranças da empresa a agricultores locais, bem como há política de proibição de ocupação da área, obrigando muitas pessoas a morar em Laranjal do Jari, no Amapá', completa. O MPE também realiza reuniões, articulações, estudos e levantamento sobre o mapa de conflitos na região a fim de subsidiar futuras ações como inquéritos civis.
Títulos definitivos
A certificação dos territórios na área do Jari é de responsabilidade do Iterpa. Por se tratar de um território muito grande a ser fiscalizado e registrado pelo órgão, foi preciso a colaboração das comunidades e da empresa, de forma pontual para finalizar os trabalhos. Desde 2006 o órgão estadual trabalha com grupos na região para o reconhecimento e normalização da posses das comunidades tradicionais, que estão sendo cadastradas para que possam receber os títulos definitivos. O estudo deve ser concluído até o final de agosto. Também deve ser assinado um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) para regularizar a área da empresa em Almeirim.
O presidente do Iterpa, Carlos Lamarão, disse que o processo de regularização das terras na região do Projeto Jari, em Almeirim, ainda precisa passar por 'estudos jurídicos para definir, de uma vez por todas, a exata dimensão das terras que poderão vir a ser reconhecidas pelo Estado do Pará'. Ele reiterou ainda que esses estudos precisam ser concluídos com a ajuda de membros da Procuradoria Geral do Estado, Iterpa, MPE e advogados das empresas.
'Definida a dimensão dessas áreas e concluídos os trabalhos de levantamento e cadastramento de todos os legítimos ocupantes ali identificados pela equipe do Iterpa, já será possível garantir a titulação definitiva, individual ou coletiva, desses ocupantes, por meio do instituto jurídico da doação ou alienação não onerosa, assim prevista na legislação de terra em vigor. Para tanto, haverá a necessidade da celebração de um TAC', esclarece.
Por fim, o presidente do órgão destacou que depois de emitidos os títulos definitivos das terras, o Estado deve fiscalizar o uso correto das áreas que sobrarem, buscando uma saída de torná-las produtivas e protegendo da ação de posseiros. 'Desse modo, será possível selecionar e qualificar pessoas da própria região, de preferência os mesmos beneficiários dos títulos de doação que serão expedidos pelo Estado em benefício dos integrantes das comunidades tradicionais', conclui.
Entenda
 O empreendimento que ficou conhecido como Projeto Jari teve início em 1967 às margens do rio Jari, entre os estados do Amapá e Pará. Observando a explosão da demanda por celulose no mundo, o magnata americano Daniel Ludwig conseguiu autorização do governo brasileiro para explorar uma imensa área de floresta na região amazônica. As terras se destinariam ao plantio de uma espécie de árvore própria para a produção de celulose, à instalação de uma fábrica, de uma usina termoelétrica e de toda a estrutura logística considerada necessária para tirar a região do isolamento.
Foram abertas estradas e ferrovias e construídas vilas operárias na área, o que trouxe desenvolvimento. Entretanto, a inadaptação do projeto às condições da floresta e os prejuízos crescentes levaram o magnata, em 1981, a repassar o empreendimento a um grupo de empresários brasileiros. Eles também não conseguiram encontrar uma solução equilibrada para os graves problemas sociais e ambientais que passaram a dominar o Vale do Jari.
Em 2000, após dois anos de negociação, o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) transferiu para o empresário paulista Sergio Amoroso, presidente do então Grupo Orsa, hoje com o nome de Grupo Jari (controlador da Jari Celulose), a administração dos ativos então existentes, sob o compromisso de quitar a dívida com o grupo de credores e tratar o passivo econômico, social e ambiental da região de forma conjunta. Um dos principais objetivos do grupo hoje é conseguir o reconhecimento legal da área da empresa.
Desenvolvimento
Desde quando assumiu o projeto em 2000, o grupo Jari Florestal já investiu mais de mais de R$ 50 milhões na região. Foram R$ 10 milhões em estradas, R$ 16 milhões com iluminação pública e mais de R$ 320 mil com a manutenção de aeroportos, entre outros investimentos. A empresa também criou uma fundação sem fins lucrativos que desenvolve programas sociais na áreas de saúde, educação e meio ambiente com as comunidades que ficam no entorno da região do projeto. A ideia da Fundação Jari também é proporcionar o crescimento sustentável na área com o auxílio dos extrativistas e agricultores.
Para a gerente jurídica do grupo Jari Florestal, Maria Marliete Martins, a área do projeto passa por um grande problema que o Brasil enfrenta há muito tempo: a regularização fundiária. Ela reconhece que o trabalho de levantamento de dados realizado pelo Iterpa vem surtindo efeitos positivos e que poder ser uma saída viável para o impasse. 'Não faltaram tentativas por parte do Iterpa, que em 2006 iniciou o trabalho administrativo de levantamento de dados e de demarcação das terras das comunidades na região, retomado em maio de 2013, o que já vem surtindo resultados muito positivos e, a meu ver, sem possibilidade de retrocesso ou interrupção, pelos avanços que já alcançou. Importante entendermos que na região do Jari, tanto a empresa ou qualquer outro detentor ou possuidor de terras, passam pelo mesmo problema e enfrentam o mesmo processo: a necessidade e pendência de regularização fundiária!', explicou.
Ao ORM News, o grupo Jari Florestal também negou os conflitos envolvendo a empresa na área e destacou que a mesma possui uma boa relação com as comunidades tradicionais. 'As comunidades vivem em harmonia com a empresa, desenvolvemos vários projetos de geração de renda, capacitação profissional, educação ambiental, e empreendedorismo por meio da Fundação Jari. Eles são verdadeiros aliados para a preservação e conservação ambiental. Temos uma equipe de assistência técnica especificamente para atender a agricultores e extrativistas, inclusive temos parceria com a Emater (Empresa de Assistencia Técnica e Extensão Rural do Estado do Pará) e prefeituras locais, além de outras instituições para que os agricultores possam acessar financiamentos e politicas públicas', explicou Augusto Praxedes, gerente de relações institucionais do Grupo Jari.
De acordo com Rafael Almeida, da Fundação Jari, muitos conflitos na região são causados por oportunistas ou grupo político-partidários que desejam tirar vantagem no processo de demarcação das terras, que começou a ser realizado em 2006 pelo Iterpa. 'O que ocorre em determinados casos são atos de reintegração de posse a favor do Grupo Jari, dadas por decisão judicial, sobre situações de ocupação ilegal por terceiros, em áreas de reserva Legal e APPs (Áreas de Preservação Permanente) o que quase sempre é feito por pessoas de fora, incentivadas por alguns grupos politicos-partidários e, sobretudo, empresas ligadas ao setor madeireiro', explica ele, ressaltando que os casos representam somente 1,5% das famílias que ocupam tradicionalmente a área de atuação do grupo Jari. 'Não há conflito agrário e nunca houve no Jari! O que tem havido ultimamente é um 'conflito de interesses', haja vista que ao longo dos últimos 10 anos o Grupo Jari só precisou promover cerca de 95 ações de reintegração de posse, para uma área de 900 mil hectares de área operacional que detém. O que houve ao longo desse período foram invasões e tentativas delas, em pontos isolados e diferentes, algumas reiteradamente pelas mesmas pessoas, e sempre em ramais de floresta nativa e de madeira nobre', completa Maria.
Os executivos da empresa também ressaltam que a ausência de uma regulamentação no Jari atrasa o desenvolvimento econômico e social da região, visto que a produção da celulose ainda pode ser a principal saída para tornar a área economicamente viável. 'É natural que a pendencia de regularização fundiária da região como um todo, e não apenas do grupo Jari, cause essa perspectiva em grupos de interesses antagônicos. No entanto, o grupo Jari acredita e continuará acreditando que o Governo do Estado está ciente da urgência e da necessidade de conclusão desse projeto como única saída e viabilidade econômica e sustentável da região do Jari. Para isto, terá a capacidade de filtrar e enxergar todos esses interesses, em parceria com as leis e normas fundiárias do Estado, da forma que vem conduzindo, já que convocou e conta com a ajuda e participação de diversos órgãos oficiais e legais, como a Ouvidoria Agrária Nacional e o Ministério Público do Estado, entre outros', finaliza a gerente jurídica da empresa.

Postado por: Jarí Noticias em 15/07/2014
 

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